*Não fosse o amanhã, que dia agitado seria o hoje!

terça-feira, 26 de julho de 2016

“A internet nos tornou mesmo mais livres?” por Helio Gurovitz

O papa Francisco convidou as milhares de freiras que vivem enclausuradas a não se deixarem "dissipar" pela internet, ao tornar públicas nesta sexta-feira (22) as novas regras sobre a "vida contemplativa". "Em nossa sociedade, a cultura digital influencia decisivamente a formação do pensamento (...). Este clima cultural não deixa incólumes as comunidades contemplativas... Estes meios podem certamente ser instrumentos úteis (...), mas peço-lhe o discernimento prudente, a fim de que sejam colocados a serviço da formação à vida contemplativa (...), e não de ocasiões de dissipação e fuga da vida fraterna em comunidade nem prejudiciais para a sua vocação ou um obstáculo a sua vida inteiramente dedicada à contemplação", escreveu o papa em sua Constituição Apostólica Vultum Dei quaerere (A busca do rosto Deus). Quaerere na íntegra

Atenas, na Grécia Antiga, abrigou a primeira sociedade a acreditar que a liberdade de expressão era essencial ao bom governo. Mais de 2.500 anos atrás, qualquer cidadão ateniense podia falar livremente à assembleia reunida perto da Acrópole. Todos ouviam. Decisões coletivas eram tomadas por meio do debate aberto e de argumentos racionais, no regime chamado de “democracia”. Não é à toa que, em grego antigo, discurso e razão são a mesma palavra, logos, de onde derivaram a “lógica” e o “racionalismo”.

Hoje, a liberdade de expressão não é um conceito uniforme. Mesmo as sociedades ocidentais, tidas como livres, a interpretam de modos distintos. As mesmas manifestações contra etnias ou culturas podem ser proibidas na Europa, mas permitidas nos Estados Unidos. Para não falar em países autoritários, que cerceiam imprensa e cidadãos, como Rússia, China, Venezuela ou ditaduras na África e no Oriente Médio. A internet encurtou as distâncias, tornou mais agudos os dilemas – e mais urgentes as escolhas relativas à liberdade de expressão. À medida que governos e corporações digitais estabelecem controles sobre a informação, esvai-se o ideal da grande praça global que traria, nos moldes atenienses, liberdade, democracia e racionalidade a bilhões de conectados.

“Na internet, há um risco de fragmentação em milhares de pequenos ‘casulos de informação’: câmaras de eco em que as notícias e opiniões que vemos são as preferidas por quem pensa igual”, escreve o historiador britânico Timothy Garton Ash no recém-lançado Free speech: ten principles for a connected world (Liberdade de expressão: dez princípios para um mundo conectado).

Ash apresenta um decálogo para tentar manter vivo o ideal racional da livre troca de ideias no mundo convulsionado, dentro e fora das redes sociais, pela intolerância com a diversidade, pela histeria politicamente correta, pela invasão da privacidade e pelo mais abjeto e racista discurso de ódio. Para lidar com esse “esgoto”, ele adota uma posição comum entre europeus de esquerda. “Deveríamos limitar a liberdade de expressão o mínimo possível por lei e pela ação executiva de governos e corporações”, diz. “Quanto menos quisermos obrigar por lei, mais precisaremos fazer nós mesmos.” CONFIRA